O ideal de Missão Provincial
entre Fray Bartolomé de Las Casas e Juan Guinés de Sepúveda
O
projeto de expansão ultramarina dos Países Ibéricos (Portugal e Espanha)
revolucionou a civilização e a economia Europeia. Com a chegada de Cristóvão
Colombo na ilha de Bohio, batizada de Hispaniola em 1942, os Espanhóis se
depararam com terras habitadas por povos com culturas muito diferentes das conhecidas
na Europa. Tais diferenças resultaram em diversos choques e relações com os
nativos, desde trabalhos de cooperação a escravização e extermínio de povoados
inteiros.
Objetivando
a libertação dos indígenas para interesses religiosos, a Coroa Espanhola
publicou em 20 de junho de 1500 a Real Cédula, na qual condenava atividades
escravistas, declarando que os índios deveriam ser considerados vassalos livres
da coroa. (SCHELL, pg:26). A Real Cédula não impediu o uso de mão de obra
forçada dos nativos, sendo implementado, em meados do século XV, a noção de
guerra justa.
Os
objetivos da guerra justa, segundo Sepúlveda, são: “manter a paz e
tranquilidade, justiça e prática de virtude, tirando aos homens maus a
faculdade de danar e de ofender” (GUITIÉRREZ, pg:225). Na realidade o termo “guerra
justa” foi o meio legal encontrado para utilizar a mão de obra indígena. Seriam
consideradas justas toda guerra que repeliam força com a força, reagindo a uma
injusta agressão, legítima autoridade, reaver pessoas ou objetos
capturados/saqueados. Em geral, os índios continuariam sendo tomados por
escravos.
Em
sua carta para o conselho das índias, Fray Bartolomé de Las Casas descreve
relatos de crueldade cometidos por Espanhóis contra índios. Baseando-se nas
leis, os colonos espanhóis começaram seus grandes estragos. Tomaram as mulheres
e filhos para lhes servir e usar da maneira tal qual desejavam, saqueavam os
alimentos e, não satisfeitos, levavam os homens das aldeias para minas de
extração de ouro e prata, na qual muitos acabavam morrendo de exaustão.
Mulheres também eram usadas como mão de obra, sendo encaminhadas para fazendas,
com a função de cavar a terra e cultivar as plantações. A fome matava tanto
quanto a exaustão. (BARTOLOMÉ).
Em
contrapartida, Sepúlveda, em seu longo discurso, argumentava para provar que a
guerra contra os índios era justa. Em suas falas ele fez uso de quatro
argumentos, baseando-se sempre na bíblia e na igreja, dizia: 1- Pela gravidade
dos delitos cometidos pelos índios, principalmente pela idolatria e demais
pecados contra a natura, como roubos e adultérios; 2- Pela rudeza de seus
engenhos, os tornavam naturalmente bárbaros; 3- Pela expansão da Fé, pois
dominados eram mais fáceis de persuadir a pregação; 4- Impedir as injúrias
cometidas a outros, como a sacrifícios ou o canibalismo. (GUITIÉRREZ, pg:228).
Las
Casas discordava desses argumentos, afirmava que os “índios poderiam ter seus
próprios governos e que a fé católica deveria chegar de forma pacífica, nunca
através da guerra e a doutrina de Aristóteles jamais poderia ser usada como
base para caçar os bárbaros como animais” (GUITIÉRREZ, pg:228). Ele deixa todos
os seus descontentamentos explícito em sua carta Memorial. “Todas as nações do
mundo são homens, e de cada um deles só pode ser uma a definição: todos têm
entendimento e vontade, todos têm cinco sentidos exteriores e quatro
interiores, e se movimentam por meio deles, todos se alegram com o bem e sentem
prazer com o saboroso e alegre, e todos rejeitam e aborrecem o mal e se alteram
com o sem-sabor e lhes faz dano[...]” (GUITIÉRREZ, pg:231).
Portanto,
o ideal de missão providencial que orientou a colonização encaminhou o
extermínio de centenas de nativos das novas terras. Fray Bartolomé de Las
Casas, ao confrontar o filósofo espanhol Juan Ginés de Sepúlveda, tentou pôr um
fim a essa matança, argumentando no que ficou conhecido como “A Controvérsia de
Valladolid”. Seus atos não obtiveram muito sucesso e sua luta solitária, a
favor dos índios, durou por toda sua vida.
Referências:
GUTIÉRREZ,
Jorge Luis. A Controvérsia de Valladolid (1550): Aristóteles, os índios
e a guerra justa.Revista USP. São Paulo. Nº. 101. Pp. 223-235.
março/abril/maio 2014
BARTOLOMÉ,
Fray de Las Casas. Brevísima relación de la destruiccíon de las Indias
(1552).
SCHELL,
Deise Cristina. Os índios na conquista espanhola da América. Leyes
nuevas e reoresentações à época da jornada de Omagua y Dorado. Revista de
História UFBA (2010) p. 22-38.
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